quarta-feira, 29 de julho de 2009

Ciclos

Lá estava ela, sentindo em suas ranhuras as forças da Natureza. O sol impiedoso a abraçava, fazendo reluzir seu tom avermelhado, mas envergonhada, se fechava. Seu tronco repleto de espinhos, cada um com sua história, com sua proeminência ameaçadora, marcando-a pelos anos de vida.
Protegia-se como quem está em apuros, guardava suas energias como quem quer viajar até o infinito. Respirava suavemente... Ao seu redor a vastidão do deserto. Nada além de grânulos minúsculos dançando uma valsa desmarcada. Suas raízes penetravam fundo o chão movediço, tentando alcançar o bálsamo da vida. Em vão...
Espalhava-se através dos ventos uivantes, tentando chegar ao oásis mais próximo. À noite, sonhava com a companhia de flores. Seu doce perfume se expandiria por ares virgens e os pássaros que antes apenas a sobrevoavam poderiam agora banhar-se nas mesmas águas que resgatariam sua exuberância e provariam do néctar que se enchia em sua boca. Estava aberta, entregue aos caprichos das estrelas, que iluminavam o caminho dos viajantes, que provocavam pedidos quando cadentes, mas que ignoravam a beleza dos seus contornos delicados.

Mas antes que pudesse sentir o amor correr em seu sangue, o astro-rei acordava de seu sono, vigoroso, imbatível, e mais um ciclo recomeçava, com a rosa em meio às dunas.


Saudações fraternais,

Fabio Machado.

*Texto inspirado pelo livro Rosas em Dunas
da minha amiga Yeung Luk Chong.

3 comentários:

Raquel Med Andrade disse...

Amei, Fábio!!!Acho que toda mulher vai se encontrar - nem que seja um pouquinho - nesse seu texto. Chico Buarque que se cuide contigo...rsrsrs
Beijos

Daniela Yoko Taminato disse...

é que me trouxe a recordação daquela rosa de Exupéry, mas totalmente outra e avessa: menos orgulhosa, menos tola, tão frágil quanto e mais sonhadora. E sobre sonhar... ah como vale a pena sonhar! Mesmo no deserto.

Fabio Machado disse...

Hoje me disseram que eu revelo o mistério no final dos meus textos, então eu pensei: (som de campainha de resposta errada) isso não é bem verdade !
Dessa vez eu pensei que ninguém ia imaginar a minha inspiração existencial, mas me enganei, Srta. Taminato.

Apesar de concordar que somos responsáveis pelo que cativamos, eu acho a minha rosa muito mais 'descolada', 'saudável' e 'viva' que a Antoinesca. Ela vai inclusive viver mais que a francesa ! rs